segunda-feira, 29 de março de 2010

Beto Hippie II

Pesquisa Biográfica Beto Hippie. Consulta a fontes próximas do cantor pavunense garantem que sua obra vitimada pela expropriação é significativa, mas sem acesso ao discurso, passará às mãos de inescrupulosos. Partes das canções aparecem na internet, assinadas por companheiros do compositor. Muitos alegam que é difícil distinguir a verdade sobre a autoria das canções, porque afirmam que Beto Hippie participava de vidas comunais, coletivos de arte, como: Panela de Pressão e o Musiclub.



A memória nestes casos é tendenciosa. Ninguém irá assumir uma escorregadela ética, isto em se tratando de apropriação intelectual. Como não há registro de gravação, não há como distinguir quando foi a primeira audição das músicas de Beto Hippie. Sua memória sofrerá um processo de desqualificação pelo modo de vida que levava, conservando hábitos nômades, sem a preocupação de preservar a questão autoral, com a ingênua crença de que todos os seus amigos ainda estavam na mesma viagem. O tempo provou que não.



Dois rapazes, Amaury, filho de Alberico, dono do bar onde Beto fazia ponto, e, Renato Freire, conviveram com o compositor durante largo tempo, escutando suas aventuras e canções. Beto Hippie era alcoólatra e para conseguir um trago vendeu o próprio violão. Mas o instrumento foi resgatado por estes dois admiradores do trabalho desenvolvido pelo compositor. Como agradecimento a atenção especial, Beto confeccionou um caderno, ao parece seu testamento litero-musical, com as suas composições. Todo ele manuscrito, parece ser a única documentação disponível que se opõe a avalanche de negativas de que Beto não seria o autor de músicas como Boa Aparência ou Maracujá de Gaveta.



Se Beto Hippie não fosse o autor das músicas citadas, por que deixaria documentado que dezoito composições, um número tão exíguo, tão delimitado, se poderia se valer de sua memória para deixar cinqüenta, mesmo que não lhe pertencessem? Não há indicativo de que algum modo gostaria que estivessem devidamente “registradas” para não ocorrerem enganos como a atribuição para outrem daquilo que supunha seu? Se a este gesto creditarmos uma preocupação ética, ele não estaria restringindo seu legado às composições distribuídas nas páginas do caderno como as mais representativas daquilo que criou? Não acredito que um homem bêbado, como invariavelmente ele estava, se desse ao trabalho de escrever dezoito composições em um caderno e entregá-lo a dois rapazes, que não fossem suas de fato. O prestígio que poderia angariar terminaria quando o bar fechasse, encerrando-se assim o único palco de suas apresentações cotidianas.



A minha inclinação é pelo cuidado pouco usual com que Beto Hippie confeccionou o caderno, com apenas dezoito composições, entregando-o a dois rapazes para serem testemunhas/testamenteiros litero-musicais do que criou e sair de cena com sua morte. As versões depois de sua morte são inúmeras, mas restará como entrave a pergunta, se Beto era um maluco, um outsider sem paradeiro, dormindo muitas vezes nas sarjetas: por que anotar em um caderno este número tão limitado de canções se não lhe pertenciam?

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